Por Djan Madruga
Aproveitando dois recordes mundiais master que aconteceram no mesmo fim de semana, no final de agosto, escrevo sobre uma nova realidade que vem se revelando no esporte brasileiro, dos atletas master de alto rendimento e de lazer. O primeiro recorde foi do nadador gaúcho Anton Biedermann, de 100 anos, que no fim de semana de 24 e 25 de agosto de 2024 bateu o recorde mundial da sua faixa etária centenária no Campeonato Gaúcho Master, na prova de 50 costas, com 1.09.08. No mesmo fim de semana, Nicolas Santos, de 44 anos, também bateu o recorde mundial master na sua faixa etária (40+) só que no Campeonato Paranaense de Natação Master nos 50 borboleta, com 23.72.
Foto: Grêmio Náutico União/ Divulgação
Ao comemorar o recorde do senhor Anton, troquei mensagens com um dos maiores treinadores de natação do Brasil, Roberto Pável, ele um master também, só que da pedagogia esportiva. Aos 88 anos ainda dá uma aula de hidroginástica simplesmente espetacular, além de capacitar treinadores de natação por todo Brasil. Mestre Pável, ex nadador recordista sul-americano, disse que Anton é um verdadeiro Matusalém, eu repliquei, chamando-o de Mastersalém, mas, brincadeiras à parte, digo que Anton representa o topo do Everest master para todos os atletas do Brasil, masters ou absolutos, que gostariam de quem sabe um dia chegar, aos 100 anos com tamanha vitalidade e lucidez.
Vejamos com mais atenção os casos dos iniciantes master Nicholas Santos, maior nadador de borboleta da história do Brasil, que até ano retrasado ganhou um campeonato mundial absoluto e agora está ingressando nas competições master na sua meia-idade, e da Carol Sarruf, faixa 35+, nadadora do Rio de Janeiro, que também bateu um recorde mundial master no primeiro semestre deste ano, numa competição da Federação Aquática do Rio de Janeiro, na prova de 100 borboleta, mostrando que as mulheres também estão fortes no master. A Carol e o Nicholas estão fazendo a transição para o master ainda em atividade profissional. Ele ainda nada exibições e ela compete no absoluto, nadou inclusive o Troféu Brasil, pelo Flamengo, e paralelamente está competindo regularmente no master.
A mesma iniciação no esporte master que milhares de atletas pelo Brasil estão fazendo, sejam eles de alto rendimento, ou simples praticantes de atividade física, que dão o pulo do gato master, se inscrevendo em competições de natação, corrida, maratonas aquáticas, ciclismo, triathlon, vôlei, basquete, lutas, vela, surfe, danças, etc. A grande maioria apenas busca lazer ou melhorar a saúde e se divertir. Uns poucos como o Anton, o Nicholas, e a Carol, atuam num nível mais sério, buscando recordes e medalhas, estes, chamo de masters de alto rendimento.
Mas, o que vem causando essa explosão de competições e atividades master? Sem dúvida, a conscientização da importância da atividade física e esportiva para a saúde e claro o envelhecimento saudável da nossa população. Conforme dados públicos, já temos mais de 22 milhões de brasileiros idosos, com 65 anos ou mais, e a pirâmide etária brasileira está se invertendo, um fenômeno demográfico que ocorre quando a população de idosos é maior que a população de jovens (pessoas com menos de 15 anos). No Brasil isso acontecerá até 2050.
Outro fator é a questão econômica, pois os adultos e idosos são muito mais propensos a investir na sua atividade física, e os promotores de competições, sejam eles federações ou empresas organizadoras de eventos esportivos, descobriram esse fantástico público. Os adultos e idosos garantem uma clientela mais fiel e lucrativa, por isso tantos eventos esportivos, incluindo faixas etárias com muitos atrativos master.
Também devemos crédito para as entidades que cuidam do esporte master, que estão evoluindo muito. Embora sem ou com poucos recursos públicos, elas adquiriram muita experiência em décadas de trabalho duro para se viabilizar, sobrevivendo com recursos do seu próprio público interno. Cito algumas como exemplo, a ABMN, Associação Brasileira de Natação Master, que existe desde 1984 e organizou um Campeonato Mundial Master no Rio de Janeiro em 1990, ela comemora esse ano 40 anos de existência; a ABRAM, Associação Brasileira de atletismo master que existe desde 1989. Há também confederações que cuidam do seu esporte master. É caso da CBTM, a Confederação Brasileira de Tênis de Mesa que organiza eventos masters desde 1998, tendo também sediado um campeonato mundial de veteranos no Rio em 2008, e da CBV, a Confederação Brasileira de Vôlei, que organiza anualmente no seu centro de treinamento em Saquarema, no Rio, o maior evento de um esporte master do Brasil com 3.000 inscritos, sendo 200 equipes de quadra e 500 duplas de praia.
No Brasil, há centenas de entidades de organização master pelos estados, tanto que foi criado em 2009 um Comitê Brasileiro de Esporte Master, o CBEM, que vem desde então atuando para a promoção e o reconhecimento legal do esporte Master no Brasil. O CBEM se relaciona com uma entidade internacional master, reconhecida pelo COI e sediada na Suíça chamada IMGA, que prega e promove o esporte para todos no mundo. Organiza, inclusive, uma olimpíada master a cada quatro anos, sempre no ano seguinte ao da olimpíada absoluta. É um dos maiores, senão o maior, evento poliesportivo do planeta. A última edição em Auckland, em 2017, teve 28.000 inscritos em mais de 30 esportes. O CBEM vem trabalhando duro na área política e conseguiu em 2023 a inclusão do esporte master na nova Lei Geral do Esporte, reconhecido no artigo Art. 14 assim descrito:
“§ 2º O esporte master e suas organizações esportivas são reconhecidos como integrantes do SINESP e desenvolvem-se nos níveis da excelência esportiva e do esporte para toda a vida.”
Foi uma grande vitória, pois até então o esporte master existia de fato, há décadas, mas não de direito, já que não constava na antiga Lei Pelé. Agora, existe legalmente nas suas duas vertentes, tanto na excelência do alto rendimento, quanto no esporte para todos, ou para toda a vida.
O CBEM conseguiu também no ano passado a sua inclusão na nova lei das apostas, ou das Bets, com direito a receber recursos advindos dos impostos futuros. Com isso, o CBEM estará igualmente nesta lei com o COB, CPB, CBDU, CBDE e CBC, ou seja, o ano de 2025 começará alvissareiro para o esporte master.
Recentemente, o CBEM deu um novo passo em prol do esporte master, conseguindo uma aprovação na Comissão de Esportes da Câmara, via parecer favorável do deputado atleta master Luís Lima, para sua inclusão na Lei das Loterias. Isso ainda passará por tramitação dentro da Câmara e eventualmente no Senado, onde conta com alguns apoios de peso, dos Senadores Romário, ainda em atividade master no futebol, Sen. Portinho, do direito desportivo e Sen. Kajuru, famoso apresentador de TV e rádio.
O caminho para o master conquistar o seu devido espaço no mínimo equivalente aos demais esportes no país ainda é longo, mas é promissor, porque seus praticantes estão se formando em todos os esportes absolutos praticados no Brasil, e eventualmente poderão dar o seu pulo master. Por fim, nós na comunidade master temos todo tempo do mundo, enquanto vivermos, para promover o esporte master, quiçá chegando nos mesmos 100 anos do nosso ídolo Anton Biedermann, para tão bem representar o futuro do esporte master. A propósito, Anton escreveu sua biografia chamada “50 metros a Mais”, aos 94 anos, vale a pena conferir. Abraços,
Djan Madruga
Medalhista olímpico em Moscou, 1980 e 21 vezes campeão mundial master de 1990 a 2024.
Mestre em Educação Física, Indiana University, 1984.
Ex- Secretário Nacional de Alto Rendimento, 2007 a 2009.
Criador do PAAR no Ministério do Esporte, 2007.
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