Assim como no xadrez a rainha é considerada a peça mais poderosa do tabuleiro, nos esportes que exigem esforço muscular, a realidade não é diferente. Haja vista a importância que Marta, a melhor jogadora da história do futebol feminino teve para alavancar o esporte. A atleta, eleita seis vezes a melhor jogadora do mundo pela FIFA, faz sua última participação em Copas do Mundo nesse mundial. Se marcar apenas um gol na competição se tornará a primeira jogadora a balançar as redes em seis mundiais seguidos. Aos 37 anos, Marta encerra o reinado apostando que as colegas darão continuidade ao seu legado, mesmo que tenham que chorar no começo para sorrir no fim.
Foto:Instagram@martavsilva10
O processo de renovação da seleção ainda está em curso. A técnica Pia Sundhage optou por uma postura mais conservadora, mantendo a espinha dorsal da equipe que disputou os Jogos de Tóquio. Das 23 jogadoras, mais três suplentes, 11 são estreantes em mundiais.
Fica agora a expectativa pela estreia contra o Panamá na segunda-feira (24) para entender a quantas anda o processo de transição. Entre as jogadoras convocadas, apenas sete vestem a camisa de times do Brasil.
Mas essa dificuldade não é apenas do futebol feminino. Em outros esportes como o basquete, por exemplo, as principais jogadoras também jogam fora do país. Com isso a liga de basquetebol feminino conta com menos qualidade técnica e, consequentemente, com pouca divulgação. Já a WNBA, que curiosamente foi criada justamente depois da seleção brasileira vencer os Estados Unidos, favorito ao título mundial em 1994, é uma liga forte, assim como a italiana, a russa, a francesa, a espanhola e, agora, a da Bélgica, que surpreendeu ao se tornar campeã europeia.
Tudo passa por um trabalho de base cuidadoso e por oportunidades para disputar campeonatos fortes, o que explica o fato de algumas das nossas melhores jogadoras continuarem atuando no exterior.
É o caso, por exemplo, de outra atleta veterana, a pivô Érika, de 41 anos. Com a parada das rainhas Paula, Hortência e Janeth, ela se tornou a melhor jogadora do Brasil. Mas, assim como assumir a coroa tem um peso para as rainhas, a idade também não é nada leve para as atletas. Com a velocidade do basquetebol atual, Érika dificilmente consegue ficar em quadra durante um jogo inteiro.
Para o técnico Miguel Ângelo da Luz, que conquistou o primeiro e único título mundial da história do basquete feminino brasileiro, em 1994, na Austrália, além da medalha de prata nos Jogos Olímpicos de Atlanta, em 1996, o que falta para que o basquete feminino brasileiro evolua rapidamente como o futebol feminino, não é ter uma rainha, mas respaldo e trabalho de base.
Foto:Instagram @hortenciamarcari
“Realmente quando se tem jogadoras do quilate de Paula, Hortência, Janeth, isso ajuda muito. Só que o diferencial de outras temporadas, é que eu tinha 12 rainhas. Todas jogavam para o time. A Paula e a Hortência competiam entre elas, mas o que pesava era o coletivo. Com isso, as atletas mais jovens ficavam inspiradas e queriam também ser rainhas”, explica Miguel.
Ele acredita que o Brasil precise participar mais de competições internacionais para que as jogadoras desenvolvam o melhor basquete e a comissão técnica possa observar as futuras adversárias em competições oficiais.
“O atual treinador da seleção principal, José Neto, é muito bom, mas trabalha na África e acompanha os jogos por vídeo. Certamente para dar andamento ao processo de renovação precisará estar mais próximo e, alguns meses antes do pré-olímpico, acompanhar os treinamentos, conversar com outros treinadores e ter uma atenção especial às categorias de base”, opina Miguel.
A seleção feminina de basquete tem chance de conseguir a classificação para os próximos jogos olímpicos, mas se não tiver um trabalho de base muito bem-feito, a tendência é que repita os resultados pífios conseguidos pela equipe Sub-19 que, neste domingo (23), encerrou a participação no Campeonato Mundial Sub-19, na Espanha, em 14º lugar depois de ser derrotada pela China por 76 a 62. A equipe brasileira sub-19 perdeu todos os jogos da fase de grupos e só avançou para as oitavas-de-final graças ao regulamento, que permitiu que no mata-mata também sofresse revezes contra o Canadá e a Austrália. A única vitória foi no último sábado (22) sobre o Taipei por 82 a 59, quando apresentou um bom aproveitamento nos arremessos do garrafão.
Com uma base formada por meninas com idade ainda para o Sub-17, o time não convenceu. No entanto, as jogadoras jovens ganharam rodagem. É torcer para que o choro inicial se transforme em sorriso com a equipe principal nos Jogos Olímpicos de Paris 2024 . Como ensinou a rainha do futebol brasileiro, Marta, o sorriso tem um gostinho melhor quando vem no final.
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